sábado, 28 de fevereiro de 2009

a verdadeira historia dos tres porquinhos

Recentes pesquisas (Souza, 2000, Souza 2001, Brandão, 1998) apontam no ensino da leitura, a prática da decodificação. O tipo de leitura observado com maior freqüência no Ensino Fundamental, denota uma decodificação de signos lingüísticos, através de aprendizado estabelecido a partir do condicionamento estímulo-resposta. Tal conceito, de perspectiva behaviorista-skinneriana, ignora a profundidade da experiência do contato do indivíduo com os elementos da comunicação humana.
No entanto, ler é, basicamente, o ato de perceber e atribuir significados através de uma conjunção de fatores pessoais com momento e o lugar, com as circunstâncias. É interpretar uma percepção sob as influências de um determinado contexto. Esse processo leva o indivíduo a uma compreensão particular da realidade. Essa perspectiva de ordem cognitivo-sociológica, concebe a leitura como um processo de compreensão abrangente. Sua dinâmica envolve componentes sensoriais, emocionais, intelectuais, fisiológicos, neurológicos, bem como culturais, econômicos e políticos. O ato de ler é considerado “um processo de compreensão de expressões formais e simbólicas, por meio de qualquer linguagem”.
Martins (1989) chama a atenção para um contato sensorial com o objeto livro, que, segundo ela revela “um prazer singular” na criança. Na leitura, através dos sentidos, a criança é atraída pela curiosidade, pelo formato, pelo manuseio fácil e pelas possibilidades emotivas que o livro pode conter.
A autora afirma que “esse jogo com o universo escondido no livro” (1989, p.42) pode estimular no pequeno leitor a descoberta e o aprimoramento da linguagem, desenvolvendo sua capacidade de comunicação com o mundo. Esses primeiros contatos despertam na criança o desejo de concretizar o ato de ler o texto escrito, facilitando o processo de alfabetização. A possibilidade de que essa experiência sensorial ocorra será maior quanto mais freqüente for o contato da criança com o livro.

Para desempenhar essa função, a escola se utiliza, basicamente de um material determinado e de profissionais encarregados de instruir o uso desse material. Na formação do leitor é imprescindível que a criança conheça livros de caráter estético, diferentes dos pedagógicos e utilitaristas, usados na maioria das escolas. O livro estético (ficção ou poesia), proporciona ao pequeno leitor oportunidade de vivenciar a história e as emoções, colocando em ação a capacidade de imaginação das crianças e permitindo-lhes uma visão mais crítica do mundo.
A importância da obra de ficção na escola é problematizada por Zilberman, que vê na natureza formativa um aspecto em comum entre a literatura e a escola. A autora salienta que a literatura tem “amplos pontos de contato” (1985, p.22) com o cotidiano do leitor, independentemente da fantasia do leitor e da discrepância do contexto em que uma obra é concebida, mantém-se a comunicação com o destinatário atual. As obras de ficção ajudam o leitor a conhecer melhor seu próprio mundo.
O caráter formador da literatura é diferente de uma função pedagógica. Enquanto o pedagogismo se empenha em ensinar, num sentido positivista, transmitindo conceitos definidos, a ficção estimula o desenvolvimento da individualidade. A criança (ou o leitor em formação), terá mais estímulo imaginativo com a ficção do que na recepção de postulados que devam ser decorados.
No entanto, se os professores oferecem às crianças em fase de iniciação livros inadequados ou desinteressantes, estão desestimulando a leitura, correndo o risco de perderem para sempre um leitor em formação. Ao ensinar uma leitura uniforme em todos os sentidos: linearidade nos modos de ler e uniformidade nos tipos de textos também “destroem” as possibilidades de formar leitores competentes.
Neste sentido, este artigo discute algumas uniformidades, mostrando que as maneiras de se ler mais praticadas na escola são: “a leitura pressuposta”, quando o professor pressupõe a compreensão do texto pelo aluno, como se a matéria lida fosse imediatamente entendida; “leitura instrumental”, uma estratégia mecânica, o que interessa não é o conteúdo dos textos, mas a simples emissão de voz, que deve ser feita com pontuação, entonação e ritmo adequados; “leitura seguida de trabalho de aprofundamento de texto baseado numa concepção da aprendizagem como um sistema monológico”, após a leitura oral, há sempre a explicação do professor a respeito da matéria, não permitindo a participação do aluno. Estes modos de ler praticados na escola não são considerados como uma atividade dinâmica de recriação dos sentidos existentes no texto, numa relação de intertextualidade que enriquece e amplia o sentido imediato daquilo que é lido. São, no entanto, exercícios passivos e esvaziados de significados. Sobre os textos que circulam na escola Brandão (1997) afirma a mesma uniformidade são geralmente retirados do livro didático, fragmentos de narrativas infantis e seguem uma seqüência de trabalho com poucas alterações: texto, vocabulário, interpretação, gramática, proposta de redação. Tudo é visto de forma homogênea e sob uma única abordagem, não havendo preocupação em resgatar os conhecimentos e as experiências aprendidas para o estudo de novos conteúdos. “A aquisição de habilidades, inclusive a de ler, fica destituída de valor quando o que se aprendeu a ler não acrescenta nada de importante à nossa vida.” (Bettelheim, 1981, p. 12)
Com a intenção de mudar esta realidade criamos no Departamento de Educação da Faculdade de Ciências e Tecnologia da UNESP de Presidente Prudente em 1996 o projeto Integrado “Arte e Educação” que concilia a leitura fruição com diferentes tipos de textos e propõe um trabalho de produção textual significativa. Neste sentido, A verdadeira história dos três porquinhos, de Jon Scieszka é utilizada para o ensino de textos jornalísticos.
O texto jornalístico é aquele que em função de seu portador (jornais, periódicos, revistas) mostra um claro predomínio da função informativa da linguagem: traz os fatos mais relevantes no momento em que acontecem.
Sob estes pressupostos teóricos, A verdadeira história dos três porquinhos, cujo protagonista é o lobo, que conta sua versão da história é ideal para o ensino de alguns elementos do jornal.
Na história de Jon Scieszka os repórteres de jornais não entenderam as atitudes de Lobo e acharam que um Lobo pedindo uma xícara de açúcar para bater um bolo para o aniversário de sua vovozinha, não daria ibope para a venda de jornais por isto manipularam a notícia e criaram a história onde o Lobo tenta comer e/ou come porquinhos.
Assim, a partir da discussão e leitura do texto literário, os alunos aprendem a definir alguns aspectos do jornal como: manchete, linha fina, “lead” entre outros. Tornando o aprendizado e a produção de texto significativa e prazerosa. Os resultados mostram uma perfeita compreensão das partes de um jornal, a participação ativa de todos os educandos, o entendimento da estrutura narrativa do texto informativo, bem como, o interesse pela leitura não só do jornal mas, também do texto literário.
Neste sentido, duas funções são trabalhadas: a função informativa e a função literária. A primeira, cumpre o papel de informar, de fazer conhecer através de uma linguagem precisa e concisa, o mundo real, possível ou imaginado, ao qual se refere o texto. Já os textos com predomínio da função literária da linguagem têm uma intencionalidade estética. Todos os recursos oferecidos pela língua são empregados pelo autor com liberdade e originalidade. Este recorre a todas as potencialidades do sistema lingüístico para produzir uma mensagem artística, uma obra de arte.
Além disto devemos levar em consideração a trama: “diversos modos de estruturar os recursos os recursos da língua para veicular as funções da linguagem”. (Kaufman, 1995, p.16) As tramas trabalhadas em A verdadeira história dos três porquinhos são a narrativa e a argumentativa, uma que apresenta fatos e ações na seqüência temporal e causal e outra, que comenta, explica, apresenta ou confronta idéias, opiniões e valores.
Assim, se o professor do Ensino Fundamental tiver a dimensão do que pode ser feito a partir da leitura de um texto literário, nossos alunos podem tornar-se facilmente leitores, produtores de textos, conhecedores de uma diversidade de tipos de textos, e principalmente sujeitos críticos.

Referências Bibliográficas

BETTHLHEIM, Bruno. A good enough parent. New York, Vintage, 1981.

BRANDÃO, Helena & MICHELETTI, Guaraciaba. Aprender e ensinar com textos didáticos e paradidáticos. 2. São Paulo: Cortez, 1997.

KAUFMAN, Ana Maria & RODRIGUEZ, Maria Elena. Escola, leitura e produção de textos. Porto Alegre, Artes Médicas, 1995.

MARTINS, Maria Helena. O que é leitura. São Paulo: Brasiliense, 1989.

SCIESZKA, Jon. A verdadeira história dos três porquinhos. São Paulo, Companhia das Letrinhas, 1994.

SOUZA, Renata Junqueira. Poesia infantil: concepções e modos de ensino. Assis, tese de doutorado, 2000.

SOUZA, Renata Junqueira. Poesia na educação: contribuições na formação do educador de séries iniciais. Vancouver, Universidade de British Columbia, trabalho de pós-doutorado, 2001.

ZILBERMAN, Regina. (org.) Leitura em crise na escola: as alternativas do professor. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1985.

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